Introdução
Entender como um serviço de qualidade é implantado nos estabelecimentos da saúde, assim como o gerenciamento dos riscos e a segurança do paciente são realizados, é um constante desafio a ser cumprido pelo gestor da área da saúde.
Os programas de qualidade, a certificação e a acreditação são serviços que trazem diversos benefícios às instituições que prestam serviços à saúde. Por meio desses programas é possível reduzir os índices de morbidade e mortalidade existentes nesse setor. Além disso, é possível garantir serviços de qualidade com custos menores, satisfazendo as necessidades do usuário.
Gestão da Qualidade nas Organizações de Saúde
No final do século 20 ocorreram diversas transformações nos sistemas de atenção à saúde. Conforme descrito por Bonato (2011), a concepção de qualidade começou a ser divulgada nas décadas de 1980 e 1990, isso possibilitou as transformações das organizações de saúde. As reformas atingiram o campo macroeconômico, como a separação das funções prestacionais e regulatórias, descentralização, introdução de mecanismos de mercado, novos modelos de financiamento e novos arranjos organizativos (VECINA NETO; MALIK, 2018).
Porém, essas reformas não tiveram bons resultados, pois exigiram muitos recursos e energia dos gestores da saúde e não agregaram valores às pessoas que utilizavam os sistemas de atenção à saúde. Desta forma, foram necessárias grandes alterações quanto às questões sanitárias. Essas reformas buscavam: distribuição equitativa dos serviços de saúde; atendimento humanizado; prestação de serviço com evidências científicas; garantia de proteção dos riscos para todos os cidadãos; serviços seguros para os cidadãos e para os profissionais; eficiência nos serviços de saúde; serviços direcionados para as necessidades; valores; e expectativas dos cidadãos (VECINA NETO; MALIK, 2018).
A revisão de processos, o acompanhamento de desempenho e as melhorias constantes foram fundamentais para a manutenção das organizações de saúde no mercado. A implantação dos sistemas de qualidade favoreceu maior competitividade, eficiência e eficácia dos processos e desempenho dos estabelecimentos desse setor (BONATO, 2011).
A qualidade dos serviços prestados à saúde atua diretamente na qualidade de vida dos trabalhadores, pacientes e de todos aqueles que estão envolvidos no atendimento das instituições da saúde. As instituições que prestam serviços à saúde (os de alta e média complexidade) englobam grande número de profissionais que estão envolvidos na assistência à saúde (SOUZA et al., 2019).
O movimento realizado para melhorar a qualidade das organizações de saúde contou com mudanças no campo da gestão, reestruturação e inovação, para que assim pudesse alcançar a excelência. Isso foi possível por meio de práticas racionais e com foco nas demandas dos clientes. As principais mudanças indispensáveis nesse setor formam: visão sistêmica dos processos institucionais; transformação de ações como novos padrões de autorrealização e inovação; e incentivo ao desenvolvimento da criatividade, produtividade e capacidade do indivíduo, valorizando o talento humano (BONATO, 2011).
Devido às alterações oriundas da qualidade das organizações de saúde, os profissionais envolvidos nesse ramo sofreram diversas mudanças no campo profissional e pessoal. Isso tem exigido dos trabalhadores uma postura transformadora, participativa e ativa frente às organizações e modo de trabalho (BONATO, 2011).
As práticas de qualidade tiveram início nos setores ligados aos produtos, e, posteriormente, na área responsável pela prestação de serviços, como os ligados à saúde. Dentre as principais organizações de saúde que se preocupam com a gestão da qualidade podemos citar os hospitais, unidades ambulatoriais e de emergência, clínicas, consultórios (BONATO, 2011).
As instituições que prestam serviços à saúde vêm sofrendo várias transformações e mudanças por causa das novas tecnologias e técnicas de serviço. Desta forma, essas instituições precisam aprimorar seus serviços de saúde por meio de inovações. Por esse motivo, a gestão de qualidade é um fator importante a ser implantado para assegurar os processos de melhoria contínua, sendo aplicada em todos os setores, desde a parte operacional até a administrativa (SOUZA et al., 2019).
Os hospitais, como prestadores de serviços à saúde, apresentam grande importância social. Esses estabelecimentos complexos precisam de uma perspectiva diferenciada e específica sobre a prática da gestão de qualidade (BONATO, 2011).
A gestão da qualidade deve ser organizada na manutenção e na melhoria dos padrões de desempenho, por meio de: busca por serviços e produtos melhores e mais competitivos; envolvimento e participação dos membros da organização; e ética que abrange os serviços da saúde (BONATO, 2011).
Os conceitos de qualidade abrangem diversas variáveis, envolvendo os setores e as tendências predominantes. Algumas delas priorizam o equilíbrio e a produtividade da organização, enquanto outras incentivam mais o desenvolvimento da capacidade humana (BONATO, 2011).
As ações dos gestores da área da saúde agem em torno dos conceitos de trabalho e qualidade, nos quais estabelecem vínculo com o fazer e com a percepção para as tomadas de decisão, direcionando seu plano de trabalho. Geralmente, essas ações são embasadas no conhecimento construído, ligando-os com a teoria e com a prática (BONATO, 2011).
Os gestores precisam buscar consistência e suporte para a implementação de projetos, e devem adequá-los conforme a necessidade de cada serviço, como os realizados em um hospital, unidade de saúde ou uma clínica. O gestor de qualidade, em algumas instituições, é responsável pelas ações decisórias, que fazem parte do planejamento estratégico da organização (BONATO, 2011).
As necessidades gerenciais relacionadas ao avanço científico e tecnológico das instituições de saúde necessitam de melhorias contínuas para manter a qualidade, a credibilidade e a humanização da assistência, e, assim, ser o diferencial no mercado. Por este motivo, o profissional precisa de práticas mais seguras e inovadoras, que estejam integradas e sejam capazes de transformar os desejos e ideias em realidade (SOUZA et al., 2019).
A qualidade dos produtos e dos serviços existente nos diversos setores das instituições de saúde é uma preocupação crescente dos gestores. Os serviços de saúde são um mercado crescente e de grande importância na economia de vários países, porém, os consumidores exigem um serviço de qualidade (SOUZA et al., 2019).
A qualidade dos serviços e produtos prestados na área da saúde consiste na capacidade de atender as necessidades do cliente com valores que eles podem pagar. Para melhorar a qualidade na gestão dos serviços de saúde, é necessário adotar mudanças, com foco centrado na doença e produção de saúde centralizada no paciente. Dessa forma, o trabalho não pode ser hegemônico, individualizado e fragmentado (SOUZA et al., 2019).
Conforme Galdino et al. (2016), a utilização de ferramentas da qualidade favorece o desenvolvimento de um serviço de excelência, que alcança a demanda dos usuários e promove as ações gerenciais, além de contribuir com a compreensão, identificação e solução dos problemas.
Para implantar o sistema de gestão de qualidade, é importante usar algumas ferramentas para ajudar na tomada de decisão e para analisar os fatos. Com essas ferramentas é possível elevar o grau de eficácia e eficiência da instituição de saúde. Porém, os profissionais precisam ser capacitados para que possam aplicar essas ferramentas de forma adequada (GALDINO et al., 2016).
Galdino et al. (2016) cita que as ferramentas e técnicas de qualidade são instrumentos utilizados para mensurar, definir, propor e analisar soluções para os problemas, como as listadas a seguir.
- Fluxograma: é uma representação gráfica que mostra todas as etapas do processo, e pode ser utilizado para verificar como as etapas estão relacionadas entre si. Nesse modelo, a análise do processo e sua identificação é facilitada, como apresentado na figura a seguir.
Fonte: Elaborada pela autora.
- Diagrama de causa e efeito (espinha de peixe ou diagrama de Ishikawa): é uma ferramenta utilizada na apresentação da relação existente entre o resultado de um determinado processo (efeito) e os fatores determinantes (causas) que podem afetar o resultado esperado, o diagrama está representado na figura a seguir.
Fonte: Pixel / Wikimedia Commons.
- Diagrama de Pareto: esse diagrama pode ser utilizado para identificar os problemas mais relevantes com uso de diversos critérios de medição, como a frequência e o custo. O modelo desse diagrama é mostrado na figura a seguir:
Fonte: РуÑ?лан Ð?еÑ?тереР/ 123RF.
● Carta (gráfico) de controle: este modelo consiste em avaliar quantitativamente a variabilidade e estabilidade do processo. Esse gráfico permite a separação entre dois tipos de causas de variação, informando se o processo encontra-se sob controle estatístico. Seu modelo é mostrado na figura a seguir:
Fonte: Elaborada pela autora.
- Gráfico de dispersão: esse gráfico permite a visualização da relação entre as variáveis que podem ser a causa e efeito. Com esse diagrama, é possível analisar dois fatores influenciadores ao mesmo tempo, com determinação da força existente nessas relações. O modelo desse gráfico é mostrado na figura a seguir:
Fonte: Maksim / Wikimedia Commons.
Além das ferramentas citadas anteriormente, Galdino et al. (2016) comenta que o Sistema Único de Saúde (SUS) utiliza outras ferramentas no gerenciamento e na gestão de qualidade, como a descritas a seguir.
- Acreditação hospitalar: essa ferramenta é um método de racionalização, consenso e ordenação nas instituições prestadoras de serviços hospitalares, e de educação constante dos profissionais da saúde, que utilizam o Manual Brasileiro de Acreditação.
- Ouvidoria: são canais democráticos de comunicação utilizados para receber manifestações (reclamações, sugestões, denúncias, elogios e informações) da população sobre a instituição; a ouvidoria tem o objetivo de resolver, adequadamente, os problemas apresentados, subsidiando as tomadas de decisão.
- Auditoria: é uma ferramenta construtiva e positiva que possibilita o controle da qualidade de um serviço ou produto por meio da seleção de pontos críticos do processo. Dessa forma é possível verificar, avaliar e confirmar as atividades que envolvem a qualidade.
- Indicadores: essa ferramenta é utilizada para determinar e analisar a medida do desempenho dos diversos setores encontrados na instituição de saúde, que avaliam as metas alcançadas baseando-se nos padrões estabelecidos.
- 5s: essa ferramenta tem como objetivo promover as mudanças comportamentais das pessoas, contribuindo para a reorganização da empresa, que auxilia a criação de condições para o estabelecimento de projetos de melhoria constante. Os 5s vêm dos cinco sensos, que são: de utilização, de organização, de limpeza, de padronização e de disciplina.
- Certificação: é uma ação realizada por uma empresa reconhecida que tenha credibilidade com requisitos determinados em especificações ou normas técnicas.
- Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade (PMAQ): é uma ferramenta utilizada para melhorar o padrão de qualidade no atendimento das Unidades Básicas de Saúde (UBS) por meio de estratégias de qualificação, avaliação e acompanhamento das equipes de saúde.
- QualificaSUS: tem como finalidade aumentar o nível de qualidade da assistência à população oferecida pelo SUS por meio de diretrizes estabelecidas pelo próprio SUS.
- Programa HumanizaSUS: tem como finalidade propor nova relação entre o profissional e o SUS, promovendo a implantação de práticas destinadas à humanização. Seu principal objetivo é tornar o SUS mais ágil e acolhedor, além de um ambiente de prestação de serviço confortável.
- Requalifica UBS: esse programa foi criado com incentivo financeiro do Governo Federal para realização de reforma, ampliação e construção de UBS; para isso, o Censo das Unidades Básicas de Saúde foi realizado para levantamento de informações que possibilitassem a melhoria dos serviços prestados na atenção básica.
SAIBA MAIS
PMAQ-A
O Programa de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica (PMAQ-AB) tem como objetivo favorecer um padrão de qualidade semelhante no âmbito local, regional e nacional, com maior efetividade e transparência das ações governamentais. Esse programa apresenta quatro fases que se completam e formam um ciclo. São elas: processo de adesão e contratualização de indicadores; fase de desenvolvimento do processo; avaliação externa; e processo de recontratualização das equipes e dos gestores.
Saiba mais! Acesse: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0103-11042018000600188&lng=en&nrm=iso
Fonte: Bezerra e Medeiros (2018).
Dessa forma, a gestão de qualidade é um trabalho crescente e contínuo, que deve ser aplicado no dia a dia. Permite que a empresa atinja suas metas em profissionalismo e atendimento, tornando-se um instituto de referência para a sociedade.
Gerenciamento de Riscos e Segurança do Paciente
Questionamentos e manifestações relacionados ao desempenho na área da saúde devem ser estabelecidos com o objetivo de melhorar o serviço de atendimento. Essas estratégias e esforços são elaborados com intuito de melhorar o nível da qualidade dos serviços voltados à saúde, priorizando a melhora do cuidado ao paciente (SOUZA et al., 2019).
Conforme descrito na Resolução de Diretoria Colegiada de n.º 36 (RDC n.º 36), de 25 de julho de 2013:
A gestão de risco é definida como a “aplicação sistêmica e contínua de políticas, procedimentos, condutas e recursos na identificação, análise, avaliação, comunicação e controle de riscos e eventos adversos que afetam a segurança, a saúde humana, a integridade profissional, o meio ambiente e a imagem institucional” (BRASIL, 2013, p. 2).
Os principais resultados obtidos ao realizar um adequado gerenciamento de riscos na prestação de serviço à saúde são:
- eliminação e redução dos erros;
- aumento na qualidade do serviço prestado;
- consolidação do nome da instituição no mercado;
- redução e prevenção de indenizações e processos jurídicos;
- produtividade eficiente e eficaz;
- obtenção e conquista de clientes internos e externos;
- gerenciamento eficaz do negócio;
- redução com recursos e com custos;
- melhoria na tomada de decisão;
- gestão preventiva e proativa;
- sustentabilidade institucional; e
- lucro.
A Norma Regulamentadora nº 32 de novembro, de 2005 (NR-32), estabelece as diretrizes básicas referentes à segurança e proteção à saúde do trabalhador no estabelecimento da saúde, assim como daqueles que realizam atividades de assistência e promoção à saúde em geral. Essa norma se aplica a todas as instituições destinadas à prestação de serviço à saúde da população. As ações prestadas à saúde, em qualquer nível de complexidade, são: promoção, pesquisa, recuperação e ensino (BRASIL, 2005).
Como descrito em Brasil (2005), a NR-32 dispõe sobre os mais diversos agentes de risco encontrados no ambiente de trabalho na área da saúde. Esses agentes podem apresentar risco: biológico, químico e físico.
- Agentes biológicos: é considerado pertencente a esse grupo os micro-organismos (geneticamente modificados ou não), parasitas, toxinas, culturas de células e príons.
- Agentes químicos: nesta classe estão os produtos químicos, seus intermediários químicos e seus resíduos, que podem causar riscos à saúde e à segurança do trabalhador.
- Agentes físicos: refere-se principalmente à radiação ionizante, além disso, é importante seguir as orientações específicas da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) e da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA).
O objetivo do gerenciamento de risco é prevenir o adoecimento e os acidentes ocorridos aos profissionais da saúde, controlando ou eliminando os fatores de risco que estão presentes nesse setor.
O gerenciamento de risco deve ser feito em tempo integral. Um dos cuidados especiais que devem ser tomados com os funcionários da área da saúde é evitar a exposição aos agentes responsáveis pelas doenças infectocontagiosas. Caso ocorra contato dos funcionários com esses agentes biológicos, é importante tomar os devidos cuidados de tratamento e fazer a notificação do profissional que se tornou o transmissor da doença. Em caso de a instituição não dispor desse serviço, é necessário encaminhar o funcionário contaminado para uma unidade de referência, em que receberá atendimento adequado (VECINA NETO; MALIK, 2018).
Para garantir a segurança do funcionário exposto a um agente infectocontagiante, e daqueles que podem ter contato com ele, é importante providenciar um rápido diagnóstico e adequado manejo da doença, assim como providenciar uma profilaxia apropriada pós-exposição ocupacional (VECINA NETO; MALIK, 2018).
Para assegurar um bom controle de manejo para as exposições ocupacionais, é importante o desenvolvimento de protocolos escritos e atualizados, e realização de registros e acompanhamento das ocorrências. As notificações dos acidentes ocupacionais com material biológico devem ser realizadas o mais rápido possível. Em caso de acidentes com materiais contaminados, como a contaminação por HIV, o tratamento com antirretrovirais deve ser realizado, preferencialmente, dentro das duas primeiras horas depois do acidente (VECINA NETO; MALIK, 2018).
O risco de contrair uma infecção após a exposição ocupacional varia conforme o tipo de acidente e de alguns fatores que interferem diretamente no acidente, como gravidade, presença de sangue, volume de sangue, tamanho da lesão, tempo de trabalho e aderência aos cuidados padrão (VECINA NETO; MALIK, 2018).
A identidade do funcionário deve ser preservada em casos de situação de risco ou acidente ocupacional. Dessa forma será mantida a privacidade do funcionário, evitando constrangimentos. Outra opção é a realização da codificação do acidente e das amostras biológicas do funcionário, antes do envio para os exames laboratoriais. Por isso, é importante registrar, no departamento pessoal ou no setor responsável, o Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT) (VECINA NETO; MALIK, 2018).
Uma função da instituição de saúde é tomar medidas para prevenir a transmissão da infecção, por meio do afastamento do profissional de suas atividades de trabalho. Esse funcionário deve ser orientado para evitar contato com as pessoas mais susceptíveis e essa decisão deve ser baseada conforme a epidemiologia e transmissão da doença (VECINA NETO; MALIK, 2018).
Os desafios encontrados no gerenciamento de risco consistem em fazer um bom controle de qualidade, sendo este um requisito muito importante para o negócio de saúde. O gerenciamento de risco nos estabelecimentos de saúde deve ser realizado de cima para baixo. É importante que todos estejam envolvidos nesse processo, e que todos os procedimentos e ações sejam cumpridos.
O gerenciamento de risco no setor da saúde também apresenta a finalidade de implantar ações contingenciais, preventivas e corretivas para assegurar a eficiência e a eficácia operacional, em que pode ser oferecido um serviço de saúde com segurança e qualidade para o paciente. Essas ações, se bem planejadas e implantadas, influenciam a sustentabilidade e o lucro do negócio.
A Resolução de Diretoria Colegiada de n.º 36 (RDC n.º 36), de 25 de julho de 2013, estabelece as ações necessárias para proporcionar a segurança do paciente, assim como melhorar a qualidade nos serviços de saúde. Essa resolução apresenta grande importância para os estabelecimentos de saúde (BRASIL, 2013).
A RDC n.º 36 é aplicada aos serviços de saúde em geral – públicos, filantrópicos, privados, militares ou civis, inclusive os estabelecimentos que atuam em pesquisa e ensino. É excluído dessa resolução os laboratórios clínicos, consultórios individualizados e serviços de atenção domiciliar e móveis. Nessa mesma resolução são feitas algumas definições, como: boas práticas de funcionamento; cultura de segurança; dano; evento adverso; gestão de risco; incidente; núcleo de segurança do paciente; plano de segurança do paciente no serviço de saúde; segurança do paciente; serviço de saúde; tecnologias em saúde (BRASIL, 2013).
O Plano de Segurança do Paciente em Serviços de Saúde (PSP) também é descrito na RDC n.º 36, em que as estratégias e ações para a gestão de risco ao paciente são estabelecidas de acordo com as atividades desenvolvidas no serviço de saúde, que são: análise, identificação, avaliação, comunicação e monitoramento dos riscos existentes no serviço de saúde, de forma sistematizada; integração dos diferentes processos relacionados à gestão de risco no serviço de saúde; implantação de protocolos determinados pelo Ministério da Saúde; identificação do paciente; higiene das mãos; segurança cirúrgica; uso, segurança na prescrição e administração de medicamentos; uso, segurança e administração de hemocomponentes e sangue; segurança na utilização de materiais e equipamentos; manutenção de registros adequados do uso de próteses e órteses, quando realizados; prevenção de quedas e de úlceras por pressão; controle e prevenção de eventos adversos no serviço de saúde; prevenção de infecções ligadas à assistência da saúde; segurança nas terapias parenteral e enteral; comunicação eficaz entre os profissionais da saúde e os serviços de saúde; estímulo da participação dos familiares e do paciente na prestação de assistência; e promoção de um ambiente seguro (BRASIL, 2013).
A segurança do paciente está associada à bioética e à ética médica. É importante evitar os erros ligados à assistência e introduzir medidas de melhorias assistenciais para que os mesmos erros não se repitam, essa é uma boa forma de proteger o paciente e seus familiares. Além disso, é importante realizar um diagnóstico correto e realizar tratamentos e cuidados necessários (MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
Como descrito por Vecina Neto e Malik (2018), existem metas internacionais para assegurar a segurança do paciente, e um dos principais desafios globais é o controle das infecções nosocomiais. Estas podem ser combatidas com: campanhas de lavagem das mãos; incentivo do uso de álcool gel; identificação correta do paciente; comunicação efetiva; segurança no tratamento medicamentoso; cirurgia segura; redução dos riscos de contrair infecções ligadas aos cuidados da saúde; e prevenção de quedas.
Vecina Neto e Malik (2018) relatam outros tópicos mencionados pela Organização Mundial da Saúde que precisam ser resolvidos para minimizar os riscos de incidentes: cuidado com medicação com grafias ou sons parecidos; boa comunicação na passagem do caso; procedimento e localização do corpo em que será realizado o procedimento correto; controle cuidadoso das soluções eletrolíticas concentradas; certificação de que a medicação está correta na transição dos cuidados; assegurar correta conexão de tubos, seringas e cateteres; e usar seringas descartáveis.
Por ser uma área complexa, os estabelecimentos da saúde precisam adotar práticas para reduzir os danos causados aos pacientes. A segurança do paciente está ligada à qualidade, efetividade, eficácia, acessibilidade, equidade, satisfação e eficiência dos serviços prestados ao paciente. Sem segurança não é possível alcançar a qualidade.
Auditoria em Saúde
O termo auditoria vem da origem latina “auditore” que significa “que ou aquele que ouve; ouvinte”. Existem diferentes conceitos de auditoria, variando conforme o autor. A auditoria em saúde pode ser realizada em clínicas, hospitais, home care, ambulatórios, seguros de saúde e operadoras de planos. Além disso, a auditoria pode ser realizada por diferentes profissionais, principalmente por auditores médicos e enfermeiros, mesmo sendo de áreas diferentes, que têm os mesmos objetivos.
O auditor em saúde precisa conhecer as normas referentes à estrutura de seu trabalho, as normas envolvendo suas atividades diárias, além disso, precisam respeitar os limites estabelecidos pelo Conselho Profissional e, ao mesmo tempo, utilizar as atribuições referentes à função estabelecida pelo seu conselho (BURMESTER; MORAIS, 2017).
Conforme descrito por Burmester e Morais (2017), o perfil requerido por um auditor em saúde inclui: valores éticos e morais; imparcialidade; independência; discrição; objetividade; zelo profissional; cautela; e conhecimento técnico abrangente e atualizado. Burmester e Morais (2017) menciona as competências esperadas do auditor em saúde, que são: humanas (proatividade, comunicação e relacionamento) e funcionais (inovação, domínio de processos, orientação para o cliente e liderança).
A auditoria é uma ferramenta da gestão que ajuda a evitar desperdícios, transmitir informações seguras e simplificar as tarefas referentes às atividades desenvolvidas no estabelecimento. Além disso, a auditoria ajuda a melhorar a eficácia, a transparência e a eficiência dos serviços prestados, tanto em instituições privadas como em públicas (MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019; VIANA, 2019).
Conforme Viana (2019) e Malagón-Londoño, Laverde e Londoño (2019), a auditoria de uma instituição pode ser do tipo interna ou externa.
- A auditoria interna está relacionada à auditoria operacional, é um processo amplo que pode afetar a realização dos objetivos do estabelecimento. Esse tipo de auditoria é uma atividade objetiva e independente de assessoria e avaliação, com objetivo de acrescentar valor nas diversas atividades desenvolvidas no setor que está sendo realizado. A auditoria também ajuda a cumprir as metas por meio de um trabalho disciplinado e sistemático. A avaliação engloba a verificação e análise objetiva das evidências. A auditoria interna pode ser descrita como um elemento utilizado para o controle, que proporciona a execução de avaliações sistemáticas, independentes e objetivas dos diversos processos, atividades, procedimentos e resultados da instituição de saúde. A auditoria permite manifestar opiniões baseadas em evidências referentes aos aspectos da gestão e aos resultados obtidos. Na auditoria interna é possível fazer o controle interno e analisar seus pontos fracos e fortes, assim como verificar se houve desvio dos objetivos e das metas propostas, apresentando recomendações que venham a contribuir com a melhoria dos processos.
- A auditoria externa é conhecida como auditoria legal, e auditoria financeira refere-se ao exame da verdade e à avaliação das finanças por uma entidade ou por um auditor externo. Um auditor externo é necessário quando precisa haver uma separação da propriedade ou do controle das grandes empresas (nomeação de diretores). Esse tipo de auditoria oferece garantia razoável da segurança para os proprietários da empresa, onde são comprovados pelos diretores que as finanças estão livres de distorções significativas, mantendo a confiança de todos os envolvidos no processo da auditoria.
A auditoria na área da saúde é um ciclo de melhoria na qualidade, está relacionada à eficácia dos cuidados de saúde comparados aos padrões estabelecidos para melhorar a qualidade dos resultados e cuidados de saúde. A auditoria na saúde tem a função de melhorar os padrões praticados no estabelecimento, como o atendimento ao paciente e mudanças comportamentais a nível individual, de serviço e de equipe (VIANA, 2019).
A auditoria médica é realizada com finalidade de revisar o atendimento clínico dos pacientes realizado pelos médicos. É um processo que possibilita a melhoria da qualidade do atendimento ao paciente por meio de uma avaliação sistemática da prática médica, que deve ser modificada sempre que for necessário. A auditoria médica pode ser realizada de várias formas, variando conforme os dados coletados (VIANA, 2019).
A auditoria clínica consiste na auditoria realizada em todos os aspectos referentes ao atendimento clínico do paciente. Sempre que uma auditoria clínica for realizada, é importante fazer uma reauditoria, para verificar a eficácia das melhorias e das mudanças. Na auditoria clínica, a análise dos dados coletados sobre o paciente durante sua visita é feita no estabelecimento de saúde para avaliar se ele recebeu cuidados conforme as diretrizes nacionais e se os procedimentos realizados foram apropriados (VIANA, 2019).
Os dados coletados em uma auditoria hospitalar são utilizados para avaliar se os pacientes estão sendo tratados conforme os padrões baseados nas evidências (VIANA, 2019).
Por meio da auditoria é possível controlar a qualidade do produto ou serviço prestado, selecionando os pontos críticos do processo. A auditoria permite avaliar, verificar e confirmar as atividades exercidas na instituição, favorecendo um processo construtivo e positivo.
Programas de Certificação e Acreditação
O interesse por adquirir certificados de acreditação pelas instituições hospitalares teve início no final dos anos 1980. Nesse período, o Ministério da Saúde desenvolveu uma comissão de especialistas responsável por desenvolver um modelo de acreditação (LUONGO et al., 2011).
Em 1999, surge a Organização Nacional de Acreditação (ONA), um órgão sem fins lucrativos e não governamental, com objetivo de coordenar o sistema de acreditação no Brasil. Hoje, as Instituições Acreditadoras Credenciadas (IACs) são as responsáveis por certificar e avaliar os hospitais, por meio de padrões e normas definidas pela ONA. As certificações também são embasadas pela Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) e pelas determinações da Joint Commission on Accreditation of Health care Organizations (JCAHO/EUA) (LUONGO et al., 2011).
A avaliação de acreditação inclui protocolos padronizados semelhantes aos propostos pela ISQua (International Society for Quality in Health Care), que devem ser adaptados conforme a realidade local da instituição (LUONGO et al., 2011).
A Joint Commission International (JCI) realiza um processo de avaliação com base na educação, consultoria e análise, e é representada pelo Consórcio Brasileiro de Acreditação de Sistemas de Saúde (CBA). A International Standard Organization (ISO) emite certificado de qualidade e acreditação, com certificação e aceitação universal dos serviços prestados (LUONGO et al., 2011).
A acreditação é um procedimento utilizado na avaliação sistemática dos estabelecimentos da saúde e na avaliação das estruturas, resultados e processos em menor ou maior proporção. Esse procedimento favorece o reconhecimento das ações em termo de qualidade, apresenta caráter confidencial, periódico e voluntário, sendo uma ferramenta intrínseca de avaliação da qualidade, diferenciando de outras ferramentas que apresentam caráter genérico (LUONGO et al., 2011; MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
REFLITA
Acreditação Hospitalar
As instituições de saúde sempre buscam a permanência no mercado e valorizam o atendimento de excelência. Isso pode ser alcançado por meio da Acreditação Hospitalar. Os certificados de qualidade proporcionam mudanças de hábitos, valores e comportamentos dos profissionais envolvidos com esse processo. Sendo assim, como seria uma instituição de saúde, seja privada, seja pública, sem obedecer aos parâmetros mínimos de qualidade dos serviços prestados à população?
Fonte: Elaborado pela autora.
A acreditação é baseada no cumprimento de padrões viáveis e concretos, conhecidos pelas instituições avaliadas. Embasa-se no cumprimento de preceitos legais mínimos, com níveis progressivos de conformidade. Avalia os aspectos técnicos fundamentais para a prestação do serviço e possibilita a humanização do atendimento (LUONGO et al., 2011; MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
A acreditação está relacionada à categoria da instituição de saúde, e deve considerar: a tecnologia, a infraestrutura e os recursos humanos e financeiros (MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
As etapas da acreditação iniciam com a decisão, que é tomada pelos dirigentes da instituição. Essa etapa envolve o estudo e análise detalhada dos padrões locais, comparados com o desempenho de instituições padrões. É possível utilizar um modelo binomial de conformidade, se tem ou não, também conhecido como autoavaliação. Para a autoavaliação, é preciso formar grupos de trabalho, que apresentam características interdisciplinares e de diferentes áreas; dessa forma, cada um contribui para alcançar o bom entendimento (LUONGO et al., 2011; MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
Geralmente, os órgãos de acreditação são formados por grupos de especialistas que avaliam os casos e tomam decisões sobre a negação ou concessão da acreditação. Os benefícios adquiridos pela acreditação são: mortalidade evitável; redução de incidência e gravidade dos eventos adversos; proteção contra os riscos ao profissional de saúde; redução das negligências; melhoria da credibilidade e da imagem das instituições diante de seus clientes, da comunidade e de seus fornecedores; melhor capacidade de negociação no mercado; e transformação das ações em longo prazo (MALAGÓN-LONDOÑO; LAVERDE; LONDOÑO, 2019).
As certificações e as acreditações são serviços interligados e essenciais para um estabelecimento da saúde. Elas favorecem um alcance de excelência nos diversos estabelecimentos prestadores de serviço à saúde e possibilitam um fortalecimento e respeito diante dos olhos dos clientes, colaboradores e fornecedores. Dessa forma, é possível alcançar o reconhecimento de todos.
A gestão da qualidade dos serviços prestados nos estabelecimentos voltados aos serviços de saúde é um fator muito importante. Por meio desse serviço, é possível atender as necessidades e expectativas do paciente.
O gerenciamento de riscos e a segurança do paciente consistem em uma prática sistêmica e contínua de procedimentos, políticas, recursos e condutas destinadas a reduzir os eventos adversos ao paciente. Ao proceder de forma correta, é possível garantir a segurança do paciente e do profissional e a imagem da instituição.
Para garantir que a instituição de saúde se encontra em conformidade com as normas regulamentadoras, com a legislação e com os objetivos da instituição de saúde, são realizadas as auditorias, internas ou externas – variando conforme a necessidade. Além disso, existem os programas de certificação e acreditação, que possibilitam confiança por parte do paciente quanto à realização das atividades prestadas pelos profissionais e pela instituição sobre sua saúde.